
Neca, o romance de estreia de Amara Moira, é considerado o primeiro do gênero todo escrito em bajubá, a "língua das bichas" (sic), e convida a um mergulho na cultura das travestis. Foi publicado em 2024 pela Companhia das Letras.
O bajubá (ou pajubá) é o português falado pela travesti da rua. Surgiu nas zonas de prostituição como linguagem de segurança, incompreensível para o cliente ou policial de plantão —fundamental, portanto, para desviar da violência, do cárcere e da morte.
Segundo a autora, o que criou essa linguagem foi justamente a segregação absurda que a comunidade sofria. Moira aprendeu o bajubá com travestis mais velhas no Jardim Itatinga, reduto de trabalho sexual em Campinas, no interior paulista.
Em Neca, a autora busca registrar uma rica tradição oral brasileira que, a seu ver, corre risco de extinção à medida que avança a inclusão de pessoas trans na sociedade. "Imagino um futuro em que o bajubá não seja só ferramenta de proteção e possa sobreviver como algo mais lúdico", afirma a autora, Amara Moira.
A linguagem é muito mais que uma coleção de gírias da comunidade LGBTQIA+. Destacam-se, por exemplo, palavras de origens africanas adquiridas nos terreiros de umbanda e candomblé, espaços historicamente mais acolhedores para dissidentes de gênero. Vêm daí termos como "erê", "mona" e "alibã", que ganharam significado de criança, mulher e policial —é o caso da própria palavra "bajubá", segredo em iorubá.
Há também expressões adaptadas de línguas europeias, legado da diáspora de travestis brasileiras que migraram aos milhares para lá a partir dos anos 1970, em busca de tolerância. Por exemplo, "guanti" (luvas, em italiano) virou "guanto" (camisinha, em bajubá); já o "maricón" do espanhol deu lugar a "maricona" (homem gay), conforme apontou Dani Avelar, na Folha de São Paulo de 1/11/2024.
Em comparação, é possível voltarmos à questão do uso do lunfardo na Buenos Aires argentina conforme obra de Oscar Cesarotto, Tango Malandro, já comentado aqui no Cultura em Foco: https://www.youtube.com/watch?v=iUHIeLI2URg
Confira a live no Youtube do Instituto Legus - https://www.youtube.com/c/INSTITUTOLEGUS/videos
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